Imagens inéditas mostram aviões e áreas destruídas pelo garimpo ilegal na Terra Yanomami quase 3 anos após emergência
08/11/2025
(Foto: Reprodução) Crateras cheias de água abertas em área de garimpo na Terra Yanomami.
HAY/Divulgação
Imagens inéditas registradas por indígenas mostram áreas destruídas pelo garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e aviões sobrevoando a região. Elas denunciam que a atividade garimpeira continua, quase três anos após o decreto de emergência no território.
Um vídeo gravado em outubro deste ano mostra a destruição causada por garimpeiros na região de Marauiá, próxima a fronteira entre Brasil e Venezuela. No local, há crateras cheias de água abertas no solo.
"Essa área é destruída pelo garimpo, tá vendo aí olha como está [...] tudo é destruído", afirma um dos indígenas que filma o local.
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📍️ A Terra Yanomami é o maior território indígena do Brasil com quase 10 milhões de hectares entre os estados do Amazonas e Roraima, e parte da Venezuela. Garimpeiros atuam na região desde, ao menos, a década de 1970.
Registros também mostram aviões e barcos usados por garimpeiros. Dados do Sistema de Alertas ‘Wãnori’, ferramenta de monitoramento operada por indígenas, apontam que 41 alertas foram registrados no primeiro semestre de 2025, a maioria relacionadas a questões territoriais, como invasões e ataques.
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Segundo o líder indígena Dário Kopenawa, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), a mais representativa do povo, os garimpeiros estão presentes, principalmente, onde a fiscalização é menor.
"Os garimpeiros sabem onde tem bases fortes e aonde não têm bases. Então isso, aonde tem os buracos, [é porque] os garimpeiros estão entrando na Terra Yanomami", diz Dário.
Regiões com alertas de garimpeiros
Entre 6 de agosto e 29 de outubro, ao menos oito alertas de aeronaves suspeitas. Aviões e helicópteros, foram registrados sobre as regiões de Apiaú e Xitei, em Roraima, e Marauiá, no Amazonas.
Avião sobrevoa a região de Xitei, na Terra Indígena Yanomami, em Roraima.
HAY/Sistema de Alertas Wãnori/Divulgação
No dia 8 de setembro, um avião pousou em uma pista conhecida como Pupunha, na região de Xitei, em Alto Alegre (RR). Garimpeiros chegaram ao local com munição, que teria como destino o garimpo. No dia 13, outro avião vindo da Venezuela pousou na mesma área com mais pessoas.
Outro registro foi feito no dia 12 de outubro, quando dois barcos abastecidos com insumos para o garimpo foram vistos no rio Uraricoera, na região de Palimiú. As lideranças informaram que há uma tentativa de retorno dos garimpeiros à região, conforme o monitoramento.
O rio Uraricoera, em Palimiú, é usado como rota pelos garimpeiros para chegar às áreas de garimpo através de barcos. Em 2021, comunidades da região foram atacadas a tiros. Confrontos entre invasores e agentes federais também foram registrados na região.
Área degradada pelo garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami.
HAY/Divulgação
A Terra Yanomami está em emergência de saúde pública desde janeiro de 2023. Desde então, o governo tem realizado ações para melhorar o atendimento aos indígenas e combater o garimpo ilegal.
Em outubro, lideranças elaboraram a Carta de Surucucu durante o VI Fórum de Lideranças Yanomami e Ye’kwana. O documento reconhece os esforços do governo federal contra o garimpo e na recuperação da saúde, mas cobra medidas urgentes, como:
A implementação Bases de Proteção Etnoambiental e apoio ao Plano de Vigilância Indígena da TIY;
Manutenção da Casa de Governo e das operações de desintrusão até que todos os garimpeiros sejam retirados;
Criação de Forças-Tarefa Judiciais para garantir que o Poder Judiciário conclua tanto inquéritos de investigação quanto processos abertos de garimpeiros e financiadores do garimpo;
Aprovação do Projeto de Lei 3.776/2024, que prevê aumento de penas para o crime de garimpo ilegal.
O documento também cobra que a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) transforme os recursos aplicados no território em resultados concretos. As lideranças pedem ainda uma educação diferenciada, com Territórios Etnoeducacionais que garantam o acesso a escolas bilíngues e interculturais.
"A gente espera a pós-desintrusão. Isso significa que não há mais retorno dos garimpeiros, é isso que o governo federal tem que decretar. E quando você fala desintrusão, você pede licença, isso significa que vai voltar. Então, como nós, Yanomami, precisamos, é fato: os invasores não podem voltar mais na Terra Yanomami", disse Dário Kopenawa.
"É uma pós-desintrusão, é isso que o governo federal tem que fazer, outro plano rígido, bem forte, para os garimpeiros não entrarem mais na Terra Yanomami", ressaltou Kopenawa.
Lideranças denunciam garimpos ativos e falhas graves na saúde Yanomami
O que dizem os órgãos
A Casa de Governo informou que as ações de combate ao garimpo ilegal coordenadas pelo órgão no território são permanentes e "não há qualquer previsão de que sejam interrompidas". Segundo o órgão, o plano integrado envolve atividades de comando e controle, monitoramento aéreo e atuação conjunta com órgãos federais de segurança, defesa e proteção territorial.
Em nota, o Ministério da Saúde informou que os números das ações de assistência à saúde indígena "são robustos e demonstram uma transformação estrutural". Segundo a pasta, deste a decretação da emergência, foram investidos mais de R$ 596 milhões na recuperação e melhoria da infraestrutura de saúde.
O número de profissionais atuando no território aumentou de 600 para 1.855, elevando em 72,6% os atendimentos médicos. O ministério destacou ainda a reabertura de polos de saúde, o aumento de testes de malária e a inauguração do primeiro Centro de Referência em Saúde Indígena do país, em Surucucu.
O Senado informou que o projeto de lei que aumenta as penas para crimes relacionados ao garimpo ilegal recebeu parecer favorável do relator, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), na forma de substitutivo, na Comissão de Meio Ambiente (CMA). O texto agora segue para decisão final na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde aguarda a designação de relator.
Em nota, o Ministério da Educação informou que lançou, em julho deste ano, a Política Nacional de Educação Escolar Indígena nos Territórios Etnoeducacionais (PNEEI-TEE), que busca garantir uma educação indígena de qualidade, multilíngue e intercultural.
A iniciativa estabelece 52 Territórios Etnoeducacionais em todo o país e será executada de forma descentralizada, com comissões gestoras formadas por representantes das próprias comunidades indígenas.
Ressaltou ainda que estados e municípios têm autonomia sobre a oferta do ensino e que mantém diálogo com os povos Yanomami e Ye’kwana, e com demais povos indígenas, "em prol da construção coletiva de uma educação que respeite e valorize suas identidades, línguas e saberes".
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Ministério da Justiça também foram procurados sobre os pedidos e o g1 aguarda o retorno.
Terra Indígena Yanomami
Com quase 10 milhões de hectares, a Terra Yanomami é o maior território indígena do Brasil em extensão territorial. Localizado no Amazonas e em Roraima, o território abriga cerca de 32 mil indígenas, que vivem em 392 comunidades.
O povo Yanomami é considerado de recente contato com a população não indígena e se divide em seis subgrupos de línguas da mesma família, designados como: Yanomam, Yanomamɨ, Sanöma, Ninam, Ỹaroamë e Yãnoma.
A região está em emergência de saúde desde janeiro de 2023, quando o governo federal, a partir da posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), começou a criar ações para atender os indígenas.
Comunidade indígena na Terra Yanomami.
Bruno Mancinelle/Casa de Governo/Arquivo
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